CeHlma

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Rita CeHlma

Muito prazer: Eu sou a CeHlma, assim mesmo com agá maiúsculo!

Foi assim que eu conheci a Profa. Dra. Rita CeHlma na sua primeira aula sobre Álgebra Booleana!

A moça era espevitada, falava pelos cotovelos.
A prosa não tinha ponto, nem vírgula, só travessão.
Nem sempre conseguia ir até o final das frases,
principalmente depois de fumar o enésimo, como dizia ela.
Da Cátedra, polemizava quando não concordava plenamente com a linha filosófica do autor do teorema.
- É FALSO. No infinito as paralelas se encontram sim. Quando se encontram não são mais paralelas, pô! Esse lance de interseção tá furado. Tales não conhecia Einstein.

Mas era uma moça de princípios: sempre começava tudo pelo começo.
- Zero não é um número: é a ausência plena da essência numérica.
- A UNIDADE é o Primeiro Inteiro e pode ser negativo ou positivo. O seu próximo será acrescido da mesma UNIDADE.

Não tinha hora nem panos quentes - amolou, danou-se: lá vem bronca.

Grande Mestra de Álgebra Booleana, no doutorado ela arrebentava a boca do balão.
Mas não gostava de ser chamada de professora.
- Títulos criam uma distância vetorial centro-convexa que não convém para nossas auras!
- Quero ser chamada de CeHlma, simplesmente. Quero que todos me considerem como uma colega de classe.

Aí de quem a chamasse pelo nome de Rita - horror.
- Não gosto desse nome RITA porque o meu avô era fã dos Mutantes, aqueles burgueses.

A todos os homens tratava por "rapaz", apesar de saber de cor o nome de cada um de nós, e isso ficava evidente depois que o sol se punha.
As moças eram tratadas por nome completo e, se fossem casadas, tinham um "dona" na frente do nome.

Por princípios, não escrevia na lousa - que sempre tratou por quadro negro: elegia na sala um escriba para essa operação.
Eu fui escalado muitas vezes.
- Rapaz, você aí que é canhoto e fala pouco: Vem para o quadro negro que eu vou ditar a solução dessa equação.

Quando escolhia uma mulher, havia toda uma cerimonia para convidar a escolhida para a tarefa.
- Dona Ivone Pereira Castanho de Abreu e Cunha: gostaria de convidá-la para me auxiliar na árdua tarefa de redigir no quadro negro algumas expressões algébricas que elucidarão a solução do problema ora exposto à classe. A senhora aceita o convite?
Na classe só se ouvia o salto alto do caminhar da Ivone, nem o ar se movia direito.

Quando dissertava na cátedra, gostava de fazer comparações usando ligações desconexas parabólicas.
Isso era o tempo todo, bem ... na parte do dia que tinha sol.

Na parte do dia que não tinha sol, defendia com unhas e dentes a mistura clássica inglesa à qual ela simplesmente comandava:
- Chico, o de sempre!

Apesar do Chico nos servir há muitos anos e conhecer a receita, não tinha escapatória.
- Copo gelado, 1 parte de vermouth seco, 2 partes de gin, 1 twist de limão e azeitona verde. Sem caroço e sem palito, lembra?

Nunca me atrevi a querer saber a razão. Sábia providência.

Certa vez, naquelas horas do dia em que não tem sol, estávamos no bar do Chico, todos e ela.
As moças tomavam meia-de-seda e os rapazes conhaque.
Mas, como tem o dia da caça e o dia do caçador, o dia meu chegou e eu arrisquei.
- CeHlma, sempre pintou em mim ... uma curiosidade, sabe?  ... é que eu pensei que ... será que não tem ..
- Rapaz, seja preciso e conclusivo: o tempo urge - Carpe Diem, Carpe Diem !

Perdi a respiração. A mesa toda se entreolhou com aquela cara de censura prévia.

- Tá: por que seu nome tem um agá maiúsculo no meio dele?

- O quê?

Tremi
- Repita, repita, repita!
- É que a gente escreve o seu nome com agá maiúsculo ... é só essa a minha dúvida.

Levantou-se, tirou os óculos, e sentenciou:
- Rapaz, não tenha mais dúvidas, meu nome é CeHlma com agá maiúsculo. CeHlma com agá maiúsculo. Entendeu ou quer que desenhe?
- Chico, faz outro de sempre! Que porre essa rapaz!

Parei de respirar por inumeráveis segundos, escureceu, eu só tremia. Depois passou.

Nesse dia eu entendi que, fundamentalmente  ...
Bem, talvez você também já tenha entendido, né?
Eu bem que podia ter ficado quieto.

Pra não perder a pose, também levantei e comandei como um lorde inglês:
- Chico, uma cataia lisa pra mim e mais um de sempre pra CeHlma!

-  Pára tudo! Quem mandou?
A mesa entrou em estado de catarse. As moças coraram, os rapazes disfarçaram como que não tivessem ouvido nada.

- Nada disso Chico! Faz um de sempre pra mim e outro também pra ele, mas não põe azeitona, que ele não aprecia.

- É mesmo, obrigado CeHlma. Você sempre pensa em tudo mesmo.
- Senta aí, rapaz, que eu vou contar uma boiada que rolou em Estocolmo!

Sentei sem sentir as pernas.
Pensei em perguntar em que ano havia rolado a boiada, mas meu anjo da guarda sussurrou:
"Faltavam menos de 10 horas pro sol voltar."

CARPE DIEM !

Marcio Martini
14/01/2020



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